DONA BIBITA

 


Minha amiga, anos atrás, mudou-se para uma cidade mediana em seu estado natal e iniciou um trabalho em um antiquário. A loja vendia lindos moveis antigos, raros e de valor histórico, além de suntuosos objetos de decoração em porcelanas e cristais. Nos primeiros dias, ela tratou de ir conhecendo os clientes mais recorrentes da loja, e alguns moradores populares da cidade. Não escapou aos seus olhos a pequena Josefa.

Josefa tinha entre vinte e trinta e cinco anos. A dificuldade em definir sua idade, era por conta de sua baixíssima estatura, pouco mais de um metro e quarenta em saltos altos, o que dava a ela uma aparência quase adolescente. Era natural da cidade, portanto, uma pessoa conhecida por quase todos dali. As crianças, ainda na fase infantil, deram-lhe o apelido de Bibita, que ela odiava. O apelido a perseguiu a vida toda e foi motivo de grandes discussões e, algumas vezes, até caso de polícia. Josefa passava em uma rua e não faltava quem gritasse, às escondidas, o sórdido apelido. Josefa ia atrás e a confusão estava pronta. Se tivesse muita gente, do meio da multidão, sempre alguém se abaixava, distorcia o tom da voz, e caçoava:

- Bibita! 

Josefa espumava de raiva. 

Com o corpo mignon, Josefa era muito elegante e de singela beleza. Usava plataformas e sapatos com saltos altíssimos e se vestia com coerência e distinção. Era uma das mais interessantes moças da cidade e logo encontrou um pretendente. Casou-se com um rapaz de quase um metro e noventa, o que destacava ainda mais sua baixa estatura. Minha amiga não conhecia essa parte da história, e sempre que Josefa passava pela loja, ela ouvia alguém comentar: 

- Lá vai Bibita...

Casada recentemente, Josefa decorava sua casa e quis olhar algumas peças no antiquário, onde foi atendida cordialmente pela proprietária. Observou, gostou, e ficou de retornar no dia seguinte. À distância, minha amiga acompanhou todo o atendimento. O antiquário estava com dificuldades financeiras e a dona da loja estava exultante com a possibilidade de fazer uma boa venda para Josefa. Designou, portanto, para atender a importante cliente a mais preparada vendedora, minha amiga, e fez algumas observações: 

- Quando Josefa chegar, quero um atendimento de primeira qualidade. Ela gostou das peças mais raras e mais caras do antiquário, portanto, seja delicada e atenda nossa cliente com toda cortesia possível. Ofereça descontos e faça tudo que for necessário para fechar essa venda. Não me deixe Bibita sair daqui sem comprar essas peças. Brincou, por fim, a dona da loja.

- Nem se preocupe, pode deixar, vou fazer o melhor que posso. Respondeu minha amiga, se achando preparada para o atendimento.

No dia seguinte, sabendo da responsabilidade, minha amiga caprichou no visual, se colocou no melhor local da loja e esperou que a cliente chegasse. Não demorou, Josefa apontou na esquina e chegou simpática e sorridente. Minha amiga sorriu em retribuição e foi recepcioná-la. Ajustou o tom da voz e se dirigiu a Josefa, o mais gentil e simpática que podia ser:

- Bom dia. Seja bem-vinda, dona Bibita.

Justa causa por mau procedimento.


Claudio Duarte



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Alô, terráqueos, marcianos e outros tipos de sonhadores!

O CASO DA MOÇA COM AFFONSO ROMANO DE SANT'ANNA

Senescência