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Mostrando postagens de outubro, 2025

A avó

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  Acabara de nascer o netinho e a avó não cabia em si de tão feliz. Já tinha imaginado que a família não cresceria para além dos três filhos e duas noras. Os dias são difíceis e é necessário ter mais esperança que descrença para apostar no futuro, para entregar ao mundo uma nova criancinha, aliás, a mais linda do mundo, o netinho. É preciso acreditar que o país, mais adiante, tornar-se mais democrático, igualitário, justo, vencidos os preconceitos e intolerâncias, com mais consciência ecológica... E com direito à mais literatura que à pressa da leitura em textos elementares em redes sociais e de uso desavergonhado de IA. Para isso, enfim, milita a avó, afiando desde cedo sua foice e tomando nas mãos o seu martelo. Ou o computador. Tornara-se incapaz de concentrar-se no trabalho, o tempo todo à espera de que o netinho chorasse e pudesse, na qualidade de avó raiz ou quase, oferecer-lhe o colo. Com o colo, vêm as canções de ninar. Aí começou o problema. Inquietou-se um tanto com o rep...

Dinossauro

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  Fui surpreendido no trabalho por um telefonema aflito de casa. Era a funcionária: “Seu Zé, acuda, há um dinossauro dentro de casa”. Sem dar mais tempo para nada, desligou.  Mesmo não sendo um dinossauro, conjeturei, deve ser algo grave para ela alarmar assim. Que não fosse um bicho desses, mas talvez um jacaré-açu. Estava na cara que a gravidade era quase a mesma. Tranquilizei-me um pouco ao lembrar que ela frequentemente trocava os bichos uns pelos outros. Era a chance de o bicho ser menor e menos perigoso. Ainda que certa feita tenha exagerado jurando que uma lagartixa era um dragão de Komodo, era minha obrigação correr em socorro. Por via das dúvidas, acionei Bombeiros, SAMU, IBAMA, polícia e tudo quanto é órgão que me veio à cabeça. Não pude dispor dos préstimos dos tanques do Exército porque faziam faxina nas favelas cariocas.  Corri pra casa e quando lá cheguei os agentes de socorro e gente curiosa estavam indo embora de cara torcida. Aviei umas desculpas, que nem...

QUEIMADAS

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Vivi uma experiência em criança que guardei em segredo até o dia de hoje. A cena me foi tão contundente, tão forte que por dias e noites voltava a minha memória em momentos inesperados devolvendo instantaneamente a dor e o sofrimento que presenciei e que atravessaram meu espírito.  Andava por meus nove anos de idade e morava num pequeno prédio de um bairro bucólico do Rio de Janeiro – a Tijuca e sua emblemática floresta. Estava de férias e minha traquinagem matutina predileta consistia em descer as escadas do edifício, a partir do quarto andar, trocando pães e litros de leite das portas de todos os apartamentos que alcançava numa sorrateira carreira. Quando as famílias acordavam, criava-se uma confusão trajada de pijamas camisolas e caras de sono estupefatas entre os moradores. Pois houve o dia em que me pus à escada para cumprir minhas obrigações de moleque e deparei com uma mulher grávida, nua, com o corpo em chamas. Os braços abertos acima da cabeça, olhos esbugalhados, choro co...

Feira dos sentidos e sensações

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  O que é uma feira? A origem dessa palavra, do latim “feria” significa: dia de festa. É a festa dos sentidos: a visão, o tato, o olfato, o paladar e a audição. Olhando, tateando, cheirando, degustando e ouvindo, encontramos ocasiões especiais que nos proporcionam alegria, gratidão. Está aí um evento curtido por tantas pessoas. Bom pararmos para pensar nisso:  - Deixamos, para trás o dia, às vezes difícil, as preocupações, para encontrarmos na feira, uma calma benfazeja, o sorriso de quem está de bem com a vida. Enquanto passeamos entre as diferentes barracas, vamos despertando os nossos sentidos e a nossa imaginação. Consumidores, vendedores se tornam “amigos”, de repente. Basta uma pergunta do comprador, a resposta do vendedor e surgem lembranças, conselhos, receitas. Pois bem, em quarenta episódios dinâmicos, num ambiente acolhedor, que aguçava os nossos sentidos, surgiu uma bela “Novela literária”, nas feiras de Palmas.  Seu propósito era promover a divulgação da cult...